Vídeos que circulam nas redes sociais indicam magnésio e ômega 3, entre outros suplementos, para acabar com a procrastinação
Magnésio e ômega 3 para acabar com a procrastinação? Esses "suplementos", aliados ao bacopa monnieri e o 5-HTP, são indicados em vídeos nas redes sociais com a promessa de entregar mais foco, melhorar nos estudos, procrastinar menos e até ter menos ansiedade. Mas atenção: não funcionam para isso!
A procrastinação é o hábito de deixar para depois o que poderia ser feito agora. Isso pode ser apenas um comportamento, mas também pode estar ligado a um transtorno mental.
Receitinhas e dicas de medicamentos se tornaram comuns na internet, mas especialistas alertam que algumas delas não são indicadas e podem representar um risco à saúde.
"O indivíduo ganha pelo que prescreve e ganha pelo que vende (...) Não há consultório de hepatologistas e nefrologistas que não se depare, semanalmente, com muitos pacientes que adoeceram por aderirem a essas práticas", diz Raymundo Paraná, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia.
Hepatologista: profissional da área que estuda, trata e previne doenças relacionadas ao fígado.
Nefrologista: profissional da área que estuda, trata e previne doenças do sistema urinário, em especial o rim.
Para Raymundo Paraná, muitos desses casos de adoecimento acontecem porque as pessoas não questionam a veracidade do que veem nas redes sociais ou se quem faz essas recomendações tem conhecimento técnico.
"As pessoas se acostumaram à superficialidade e tem muita gente que ganha dinheiro com isso. Isso é realmente um problema de saúde pública", afirma.
Apesar de todas as promessas on-line, não existe isso de acabar com a procrastinação usando suplementos.
Segundo especialistas, não há estudos que comprovem a eficácia do magnésio, ômega 3, bacopa monnieri ou 5-HTP para esse fim.
Genario Oliveira, professor da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia, cita alguns estudos feitos em animais ou em pequenos recortes da população, mas que não podem ser considerados como referência para os seres humanos.
Especialistas alertam que:
- Da lista de substâncias já citadas, não há documentação científica clara de benefício, muito menos para lidar com a procrastinação.
- A questão da procrastinação não é tão simples e pode ter causas diferentes para cada pessoa.
- O ideal é passar com um médico que receite medicamentos com eficácia comprovada.
- Em geral, suplementos que começam a aparecer com frequência nas redes sociais são modismos que desaparecem na medida em que se percebe a ineficácia ou insegurança deles.
- O paciente só pode ser medicado quando existe contexto de transtorno mental.
Como não há estudos para comprovar benefícios, faltam também dados científicos sobre os riscos do uso dessas substâncias.
No entanto, há relatos de efeitos colaterais quando outros fatores, como o passado do paciente, não são considerados, quando a dose é maior do que a recomendada e a periodicidade é longa, geralmente, por não ter o acompanhamento médico.
"Não é recomendado utilizar porque não tem evidência suficiente de que vai garantir o efeito principal", completa Genario Oliveira.
Magnésio - Não há comprovação científica de que o magnésio ajude com a procrastinação ou o desempenho cognitivo.
O magnésio é um mineral importante que faz parte de diversos mecanismos metabólicos e da própria função do organismo, assim como outros minerais presentes no corpo humano também.
Em pessoas com deficiência de magnésio, por exemplo, a substância pode causar fadiga.
Em doses altas, o magnésio pode levar à intoxicação e causar outros problemas, como diarreia.
"O uso universal do magnésio com a premissa de causar e tratar esses supostos efeitos e sintomas não tem documentação científica", explica Raymundo Paraná.
Nozes, legumes, cereais integrais e frutas têm o maior teor de magnésio dentre outros alimentos.
Bacopa monnieri - Há poucos estudos sobre a planta bacopa monnieri. Não se sabe quais são os possíveis riscos. As pesquisas que existem mostraram melhorias modestas em indivíduos com perda de memória e em reduzir efeitos da doença de Alzheimer, depressão e TDHA em crianças.
"Não é possível extrapolar estes resultados para outras populações", explica Genario Oliveira, professor de farmácia.
Segundo o hepatologista Raymundo Paraná, para suplementos sem estudos suficientes, como o bacopa monniere, os riscos podem ser descobertos apenas quando for tarde demais.
Ômega 3 (DHA+EPA) - Segundo os especialistas, o ômega três já está presente nos alimentos, portanto, não é necessário fazer suplementação.
Estudos sobre o uso da substância tiveram boas respostas em pessoas de 6 a 18 anos com TDHA, como um comportamento impulsivo menos acentuado em crianças. No entanto, essas pesquisas não falam sobre riscos de segurança, o que não quer dizer que não existam, mas apenas que não foram pesquisados ou abordados.
Os médicos também explicam que em nenhum caso a substância deve ser recomendada para todos os pacientes, principalmente porque a documentação científica para prevenir eventos cardiovasculares ainda é incipiente e controversa.
"Os 5-HTP e o ômega 3 são medicações fúteis [para combater a procrastinação]", afirma Raymundo Paraná.
5-HTP - Uma revisão de diversos estudos clínicos que reportaram o uso do 5 - HTP em pacientes com depressão demonstrou uma série de fragilidades na avaliação dos artigos.
Outro ponto explicado pelo hepatologista é que os testes deste suplemento não chegaram na fase 3, ou seja, os riscos só são conhecidos conforme acontecem com quem usa.
"Essas prescrições são feitas como suplementações alimentares. Não tem regulatório, não tem controle", afirma.
De acordo com o psiquiatra Saulo Ciasca e psicólogos ouvidos pela reportagem, há algumas medidas que podem ajudar a enfrentar o comportamento. Veja abaixo:
1. Procurar ajuda de um profissional, como um psicólogo, para buscar entender a origem da procrastinação e qual a impacto dela no comportamento do indivíduo.
2. Questionar-se sobre qual o motivo de adiar tarefas: estou procrastinando por que não gosto do que preciso fazer? Identificar isso pode ajudar a enfrentar o problema, mudando de área ou enfrentando a tarefa.
3. Tentar ao máximo não deixar para depois: postergar uma atividade vai aumentar o sofrimento e não resolve o problema.
4. Buscar a prática de atividades físicas, pois ela ajuda a controlar ansiedade e outros quadros de saúde mental que podem ter a procrastinação como um sintoma.
5. Procurar manter uma alimentação saudável, pois dela depende todo o equilíbrio do corpo e da mente: dieta balanceada fornece todas as vitaminas que uma pessoa sadia precisa para viver.
6. Preocupar-se com a qualidade do sono: dormir bem é essencial para ter energia, para consolidar aprendizados e evitar complicações de saúde.