
Cinco médicos e autoridades alertam: nenhuma bebida é 100% segura. Destilados têm maior risco de adulteração com metanol
No momento em que o Brasil enfrenta uma onda de investigações sobre adulteração de bebidas com metanol, cinco especialistas ouvidos pela reportagem reforçam: não há consumo 100% seguro, embora cerveja e vinho sejam considerados menos vulneráveis. Abaixo, veja as análises e considere um consenso: qualquer consumo deve ser evitado quando não há garantia da procedência.
Até agora, o uso de metanol na higienização de garrafas é a principal linha de investigação da polícia para as intoxicações.
Luis Fernando Penna, gerente médico do Pronto Atendimento do Hospital Sírio-Libanês, ressalta que os destilados são os mais vulneráveis à adulteração com metanol. Já bebidas como cerveja, vinho e chope tendem a ser mais seguras, mas não estão livres de riscos.
“O importante é evitar os destilados. Não existe uma bebida totalmente segura, mas cerveja, vinho e chope apresentam menor chance de contaminação com metanol. O vinho tem um processo de fabricação diferente dos destilados, o que dificulta a presença de metanol. Não é impossível adulterar, mas é menos provável. (...) O ponto central é que, neste momento de crise, não há bebida 100% segura. Trata-se de um problema muito grave, com risco real de morte. Até que as investigações avancem, a recomendação é não consumir".
Para Renato Anghinah, neurologista da USP, a lógica econômica e a forma de envase tornam cerveja e vinho menos atraentes para fraudadores. Ainda assim, a recomendação é de cautela.
"Neste momento, as bebidas apontadas como mais seguras, inclusive por autoridades públicas, são o vinho e a cerveja. Do ponto de vista econômico, não compensa para o fraudador adulterar esses produtos com metanol, já que o custo da diluição seria muito alto. Além disso, bebidas em lata oferecem uma camada extra de proteção, por serem mais difíceis de adulterar. Entre as opções disponíveis, a cerveja em lata aparece como a escolha de menor risco. O ideal, no entanto, continua sendo não consumir bebidas alcoólicas durante este período de insegurança, a não ser que se tenha certeza da procedência".
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, reforçou na quinta-feira (2) a recomendação de evitar principalmente os destilados, sobretudo os incolores, destacando que não são produtos essenciais.
Recomendo na condição de ministro da Saúde, mas também como médico: evite, neste momento, ingerir um produto destilado, sobretudo os incolores, que você não tem a absoluta certeza da origem dele. Não estou falando de um produto essencial para a vida das pessoas, um produto da cesta básica. É um produto que é objeto de lazer. Não faz problema nenhum na vida de ninguém evitar o consumo desses destilados. Você ter certeza de onde vem, você não aceitar bebida que um amigo te passa na festa, de um lugar que você não conhece a bebida".
Para Olivia Pozzolo, psiquiatra e pesquisadora do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), o risco maior está nos destilados, mas nem mesmo vinho, cerveja e chope podem ser considerados totalmente seguros.
"No momento, não é possível garantir com absoluta segurança nenhum tipo de bebida alcoólica. Entretanto, conforme orientações de autoridades de saúde, o risco maior atual de adulteração com metanol ocorre em destilados. Para bebidas como cerveja, chope e vinho, o risco de adulteração com metanol é considerado mais baixo. Ainda assim, recomenda-se sempre verificar a procedência, rótulo e se o produto tem registro regularizado".
A médica intensivista Patrícia Mello lembra que a história recente mostra que até mesmo cervejas já estiveram associadas a contaminações químicas graves.
“Lembro que em janeiro de 2020 houve contaminação, intoxicação similar e mortes em cervejaria de Belo Horizonte em casos similares com etileno glicol. O grande problema é que não podemos garantir segurança pois não sabemos ainda o que houve. O que podemos afirmar é que até agora os casos identificados foram vinculados a bebidas alcoólicas destiladas. Casos de sintomas suspeitos após qualquer ingestão de teor alcoólico devem ser investigado com essa possibilidade".
Em nota, a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD) afirmou que o consumo de destilados no Brasil é seguro quando se trata de produtos do setor formal, que seguem "rigorosos padrões de qualidade, segurança e conformidade regulatória".
A entidade ressaltou, no entanto, que o avanço do mercado ilegal representa "uma ameaça grave à saúde pública, fragiliza a arrecadação tributária e alimenta a cadeia do crime organizado".